TEOLOGIA BÍBLICA FUNDAMENTAL
O FUNDAMENTO
DO NOME
REVELADO
(Ex 3,14)
Exposição sintética
Collectio Praesidium Bahiense n.1
Edições
São Bento, Salvador Bahia, Brasil, 2003; pp. 88
Síntese
A obra representa uma exposição
sintética da obra maior: «A revelação do
Nome divino ‘na sarça’, Anúncio de Escatologia e fundamento de Ecumenismo»
apresentada pelo autor como tese de doutorado na Itália (1993).
Entre outros testemunhos a respeito
desta obra, pode-se lembrar a do então Card. Joseph Ratzinger, Prefeito da S.
Congregação pela Doutrina da Fé:
« ... Pude apreciar a
vastidade da análise conduzida pelo Senhor em âmbitos diferentes e com metodologias
complementares. O percurso desenvolvido e as numerosas iluminações que ele
oferece me interessaram muito e acredito que terão uma fecundidade no aprofundamento
da relação entre o mistério de Deus e o mistério da ressurreição. Enquanto lhe
desejo de poder continuar com fruto a sua atividade de pesquisa a serviço da
Igreja toda, aproveito a ocasião para estender-lhe distintos obséquios» (Cidade
do Vaticano, 20.12.1993).
Apresentação
do Prof. Giorgio Borghi*
É grande a satisfação em ver
finalmente traduzido para o português um escrito do Prof. Francesco Bindella.
Embora filhos da mesma “terra nostra”, nos conhecemos somente aqui no Brasil e
foi na função de tradutor das aulas dele, no Curso de Especialização em Pneumatologia,
promovido pelo Instituto de Ciências Religiosas “Lumen Christi”, que fui
descobrindo, com crescente interesse, a originalidade e a riqueza do trabalho
por ele desenvolvido. Junto com os alunos do referido Curso, a cada aula, vinha
me surpreendendo com a descoberta de novidades impensadas e inesperadas, em
textos bíblicos tantas vezes lidos e meditados. Isso graças, também, a uma
analise crítica muito cuidadosa (diria até amorosa) das traduções, que às vezes
deformam, até teologicamente, o sentido do texto original.
Bindella tem a arte de um guia
turístico que nos conduz a passear por uma cidade que já conhecemos (assim,
pelo menos, acreditamos) e surpreendentemente nos revela, a cada esquina,
detalhes de grande valor que nunca tínhamos reparado, e panoramas deslumbrantes
que nunca tínhamos parado para observar.
O presente texto representa uma
pequena amostra de uma reflexão bem mais amplamente desenvolvida pelo autor em
obras que são frutos de vários anos de pesquisa conduzida com rigor científico
e com profunda sensibilidade espiritual. Quando foi publicada a obra, à qual a presente
publicação se inspira, o então Presidente Emérito da Associação Teológica
Italiana, Mons. Luigi Sartori, escrevia: «O
autor coloca uma ‘racionalidade’ extrema à serviço de uma fé igualmente
extrema, fé radical até à abertura da experiência mística» (Studia Patavina, 4 –1994).
Estas páginas nos oferecem uma
reflexão sobre a centralidade teológica e a inesgotável riqueza da revelação do
Nome na sarça ardente, criando uma ligação extremamente interessante entre esta
revelação e o Mistério Pascal de Cristo.
A originalidade com que o Prof.
Bindella trata do assunto abre novos horizontes, tanto para a pesquisa teológica
como para a própria espiritualidade. São novos horizontes que permitem também
um novo olhar ecumênico, particularmente significativo na Bahia de Todos os Santos,
onde o catolicismo é particularmente inclusivo e universal, convivendo, de uma
forma talvez única no mundo, com o sincretismo e a policromia das manifestações
religiosas contemporâneas.
O Prof. Bindella costuma dizer que a
Bahia é uma terra muito “pentecostal”, no sentido de uma terra em que podemos
encontrar bem presentes muitos sinais da contínua manifestação do Espírito no
nosso mundo.
Na VI Semana de Mobilização
Científica (SEMOC) da Universidade Católica do Salvador o Prof. Bindella ministrou
um mini-curso com o tBblicatulo «Fome da
Palavra de Deus». Aproveitando a imagem da fome, imagino este pequeno texto
como um tira-gosto que desperta o apetite: apetite de mais aproximação aos
textos bíblicos, para conhecer mais a
fundo a riqueza da divina revelação; apetite de uma renovada espiritualidade e
vivência eclesial; apetite, também, de espaços e momentos ulteriores em que aproveitar
mais da competência e disponibilidade do Prof. Bindella.
* Professor de Filosofia na
Universidade Católica de Salvador Bahia.
Recenção
da
Revista «Análise & Síntese», Revista
de Filosofia e Teologia do Instituto Teologico S. Bento, Ano II-2003, n. 4,
Salvador
Bahia; autor
Dom Gregório Paixão OSB.
O texto, produzido pelo teólogo italiano Francisco Bindella,
representa uma pequena amostra de uma reflexão bem mais
amplamente desenvolvida pelo autor em obras que são
frutos de vários anos de pesquisa conduzida com rigor científico
e com profunda sensibilidade espiritual.
Sobre o texto que deu
origem ao presente tradução, LuigiSartori (Presidente Emérito
da Associação Teólogica Italiana) escreveu: «O autor coloca uma ‘racionalidade’ extrema a serviço mde uma fé
igualmente extrema, fé radical até à abertura da experiência mística. Estas páginas nos oferecem uma
reflexão sobre a centralidade teológica e a inesgotavel riqueza da revelação do
Nome na sarça ardente, criando uma ligação extremamente interessante entre esta
revelação e o Mistério Pascal de Cristo».
A originalidade com que trata
do assunto abre novos horizontes, tanto para a
pesquisa teológica, como para a própria espiritualidade.
São novos horizontes que permitem também um novo
olhar ecumênico, particularmente inclusivo e universal,
convivendo, de uma forma talvez única no mundo, com o
sincretismo e a policromia das manifestacoes
religiosas contemporâneas.
Índice
Prefácio
Capítulo I°
A REVELAÇÃO DO NOME DIVINO ‘SOBRE A SARÇA’
Estado geral da questão
§ 1. Importância
do Nome no âmbito bíblico
O Nome na magia
O Nome na literatura contemporânea
Conseqüências
hermenêuticas
§ 2. O
Nome revelado
§ 3. A
pergunta de Nome dirigida a ’Elohîm
§ 4. A
interpretação do Nome na tradição
§ 5. As
principais propostas interpretativas
§ 6. Interpretação
cristológica
§ 7. O
estado de impasse da exegese na ordinária
assimilação
de ‘Ehjeh ‘Ašer ‘Ehjeh a Jhwh
§ 8. Sobre o discernimento necessário entre
‘Ehjeh ‘Ašer ‘Ehjeh e Jhwh
a) O Nome revelado em primeira pessoa
Excursus: O conhecimento 'no Nome'
b)
O relevo de uma estrutura subjacente
à
expressão do Nome
§ 9. Premissas
à leitura interpretativa proposta
a)
«Ouvir (/ sentir) e ver»: uma
constante
na
experiência teofânica bíblica
b) O
conceito de ‘Voz’ em relação ao Nome
c) A estrutura formal da expressão
‘Ehjeh ’Ašer ‘Ehjeh
Capítulo II°
A
LEITURA INTERPRETATIVA PROPOSTA
§ 1. Os
termos próprios
§ 2. Sobre
o conceito de Voz e de Eco de Voz
§ 3. A
Voz e o médium de ressonância
§ 4. O
Nome divino ‘na sarça’ revelado
fundamento
ao
mistério de morte-ressurreição
§ 5. ‘Ehjeh ’Ašer ‘Ehjeh em relação aos
termos
teologais
do Mistério Trinitário
Capítulo III°
JESUS NA SUA IDENTIFICAÇÃO NO «EU SOU»
Premissa
§ 1. Além
do Nome «Jesus»
§ 2. Jesus
‘exegeta’ do Nome
A) O Eu Sou no kerigma pre-pascoal
§ 3. O Eu
Sou atestante a natureza divina
e inclusivo do mistério de morte-ressurreição
§ 4. O 'Eu Sou' - Verbo
§ 5. As
identificações de Jesus no 'Eu Sou'
de
forma predicativa
§ 6. Os
pseudo-cristos e a sua pretensa
identificação
no Eu Sou
B) O ‘Eu Sou’ no kérigma post-pascoal
§ 7. O
Ressuscitado-‘Eu Sou’ ou seja o «Vivente»
§ 8. As
manifestações do Ressuscitado-Eu Sou
como «Aquele que E’»
Capítulo IV°
A PNEUMATOLOGIA SOBRE O FUNDAMENTO DO NOME
§ 1. «O
Espírito enviado no Nome»
§ 2. O
Pentecostes, manifestação da Voz
§ 3. A
prerrogativa ecumênica da Voz ou seja
do Nome .... 78
§ 4. A
resurreição em relação à Voz
§ 5.
Da Cruz à Voz sobre o
fundamento
da «Pedra do Nome»
Da
Introdução
Na fé comum hebraica e cristã e também islâmica, a
revelação do Nome divino «‘Ehjeh ’Ašer ‘Ehjeh» = «Sou Aquele que Sou» na teofania da ‘sarça ardente’, representa em todo o arco do Antigo
Testamento o degrau supremo da revelação que o Deus de Israel tinha participado
ao homem. Também, dos vários nomes divinos veterotestamentários: ’Elohîm, Jhwh,
El Shadday, etc, ele é o único
que tinha sido objeto de uma revelação específica já que, em todo o arco da
Escritura, nunca mais ele recorrerá nesta sua completa formulação.
Desde o início desta pequena
exposição, será conveniente recordar a importância significativa que o nome
apresentava no âmbito da cultura hebraica e no uso bíblico. Mais do que um
apelativo convencional lingüístico, ele era considerado como expressivo da
íntima essência da pessoa (ou coisa) designada, tanto que podia manter-se
válido o dito: «Dize-me como te chamas e
eu te direi quem és», ou então: «A pessoa
é como se chama».
Um
exemplo emblemático, comumente aduzido, é aquele de Nabal que significa
‘estulto’: «Nabal é o seu nome - lê-se em 1 Sm 25,25 - e estultícia (nebalah) está com ele».
Desde o início do texto bíblico, os nomes pessoais
apresentam um significado essencial,
são expressivos da natureza íntima da pessoa designada e do particular papel
que ela exerce no quadro da ‘historia
salutis’ (assim Eva: Gn 3,20; Caim: Gn 4,1; Noé: Gn 5,29; a cidade de
Babel: Gn 11,9 etc).
As histórias dos
patriarcas apresentam explicações etimológicas abundantes: Isaac recorda a
risada de Abraão (Gn 17,17) e Sara (18,12;21,6); Jacó é aquele que astutamente
agarra o calcanhar (Gn 25,26; 27,36; Os 12,4) e o seu irmão Esaú se chama Edom,
porque era avermelhado (‘adômî: Gn
25,25) e tomou a ‘sopa avermelhada’
(25,30).
«Podemos
assim dizer - escreve H. Bietenhard à conclusão de um exame sobre o
significado do nome para as outras religiões em geral - que o nome é uma potência estritamente conexa com aquele que o carrega
e que faz conhecer a essência; quando o nome é pronunciado ou invocado, a
energia potencial de que é composto se transforma em energia atual». «O nome
não é somente uma designação; é a essencialidade reduzida a palavra».
Há, inclusive, alguns casos
em que o próprio Jhwh intervém
para mudar o nome a um eleito: é o caso de Abraão (de ‘Abram a ‘Abraham: Gn
17,5), Sara (de Saray a Sarah: Gn
17,15) e de Jacó (de Ya’aqob a Yisra’el: Gn
32,28), enquanto para Isaac dá-se a imposição
de nome no nascimento (Yitschaq:
Gn 17,19).
Há também o caso, único, de
mudança de nome a uma cidade:
Jerusalém em perspectiva escatológica (Is 1,26; 62,2; Zc 8,3) e que, em relação
a Abraão, Isaac e Jacó, será dita «preparada
por Deus para eles» (Hb 11,6) qual objeto de sua herança, a eles associada
no dom de um nome novo.
A mudança de nome
a um homem por parte de Deus na Escritura é, ao mesmo tempo, profecia e
investidura de fundação pela qual o eleito é constituído fundador e chefe em sentido orgânico: fundador de uma
instituição de origem divina destinada a penetrar e a se perpetuar na história
elevando-a a ‘história da salvação’; chefe,
no sentido que tal direta iniciativa divina impõe uma ordem salvífica orgânica pela qual o eleito se torna
lugar de incorporação para as multidões.
Em conseqüência do evento de
‘nominação’ ou seja do dom do nome
novo por parte de Jhwh a Abraão (‘um’ com Sara > Is 51,2; Hb 11,12),
Isaac e Jacó, estes virão a constituir (aquela que temos definido) a ‘tríade de fundação da aliança’, lugar
eleito de incorporação para as multidões que deles teriam descido. Em
relação a eles, constituídos na nova identidade e dignidade representada pelo
dom do nome novo, «Deus - acrescentará ousadamente a Carta aos Hebreus - não se
envergonha de ser chamado ‘Deus deles’»
(Hb 11,16).
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